segunda-feira, 30 de junho de 2014

Armazém [2]



Filomena dormiu ao lado de Joana para acudir em caso de precisão. Ficou ali na cama, dormiu ao lado da amiga e do menino, sem arredar o pé. Toda a hora em que a criança chorava de fome, todos acordavam. Josué colocava o ouvido na porta de madeira para saber se estava tudo bem, Filomena pegava o garoto a lhe fazer caretas e entregava a mãe orgulhosa que lhe saciava. Foi assim a noite toda. No dia seguinte Seu Josué levantou junto com os primeiros raios da manhã, não podia se aguentar de alegria, queria entrar no quarto, segurar o filho, beijar a esposa, abraçar a cumadi, mas sabia que as duas estavam cansadas e não perturbou o sono. Estava com tanta agonia de ver a cara do menino, de sentir seu cheiro, de ter seu peso nos braços que preferiu dar uma volta, assim, quando voltasse, todos já estariam de pé. Pegou o chapéu e saiu a caminhar. Pela hora não havia ninguém na rua, achou estranho. Olhou um lado, outro, ninguém. Estranho. Mas continuou o caminho mesmo assim. Anuviado de pensamentos de ser pai, tomou o rumo da cachoeira das sete quedas. Foi caminhando no mato e sentido o cheiro bom do verde, o sol estava iluminado, um calor agradável batia em suas costas. Quando se apercebeu estava ali olhando as setes quedas, aquela belezura que o próprio Deus pintou ali para o deleite dos olhos de todos. Ajoelhou-se a beira d'água, fechou os olhos, atou as mãos, respirou fundo, rezou mentalmente:
- Pai, o senhor me escuta? Quero agradecer Pai, pelo menino ter nascido bem, por deixar a Joana viva, por não ter complicação. Oh Pai, fico muito agradecido pelo Senhor me fazer pai também. Tô tão feliz! Tô tão feliz! Sempre quis poder ter um pedaço de mim, uma gente miúda com a cara minha. Se bem que é melhor o menino ter nascido com a cara de Joana, ela sim é uma boniteza! Pai, cê fez ele com a cara da Joana? Tomara que sim. - Deu uma risadinha abafada - Desculpa Pai, mas o Senhor já sabe como eu sou não é? Prefiro fazer graça. Abriu os olhos e viu ali, na cachoeira, sentada na borda, pés dentro d'água, uma moça com cabelos muito longos cacheados, pele bem branca, com um longo vestido reluzente. Parecia ouro puro. Josué, sem ação, ficou ali admirando a moça que abriu um sorriso. De onde menos se esperava, emergiu da água outra moça. Pele morena, os lábios pintados de carmim, colar e brincos. Parecia que estava nua, mas, de dentro da água, não se podia ver. Tinha traços mais indígenas, e olhou fixamente para o novo pai. Sorriu também. Josué se assustou, por dentro, com a aparição da moça. Fez que ia levantar, quando ouviu um assovio. Vinha do lado de lá da cachoeira, de dentro da mata. O que será que é? Será que é bicho ou gente? Pensou Josué. Era gente, um índio forte acompanhado de uma senhora negra. Ele vestido de pena e cocar, ela vestida de manto lilás. O caboclo estava sério e vinha com um arco e flecha cruzado no corpo. Olhou Josué e fechou mais o rosto, o saudou com um sim rápido. A senhorinha, sorria. Trazia as mãos juntas ao peito, em posição de reza. Josué via que ela mexia os lábios, mas não ouvi palavra se quer. Foi achando tudo muito estranho. De onde é que vinha aquela gente? Será que moravam naquela mata? Será que eram os elos perdidos do mundo? E por que nunca ninguém achou? Será que são de paz? Olhava aquele quadro bonito, todos quase imóveis. As mulheres sorrindo, o homem sério, mas respeitoso. Um arbusto balança. Quem será agora? Um velho negro se ajunta a velha. Homem simples, roupa de couro cru. Parecia resmungar, como se tivesse sido deixado para trás e, atrás dos resmungos do velho, vieram sorrisos. Riam dele. Eram dois meninos, com a cara igualzinha. Corriam rindo do velho, correndo em volta dele que esbravejava ainda mais. Sumiram na mata. Arre, eu devo de estar sonhando achando que acordei. Um barulho de trovão atrapalhou o pensamento. Olhou para cima da cachoeira. Um homem imenso de grande, forte, largo, por estar contra a luz Josué não pode ver seu rosto, mas sabia que ele o olhava, duro, sério, vivo. Carregava um escudo, eu acho, uma espada talvez. O que esse homem leva a mão? Quem é? Estava com o peito nu, usava uma espécie de saia que balançava com o vento. De repente, o vento ficou forte, soprando, soprando, soprando, era impossível manter os olhos abertos. As árvores se remexiam atrozes, dançavam violentamente, a terra do chão subiu. Na ponta da cachoeira, Josué ainda conseguiu ver uma silhueta feminina. Os cabelos mexendo violentamente com o vento, ela erguia os braços, começou a trovejar, raios desciam do céu. Josué, com medo, pensava como poderia em meio aquele sol ardente estar trovejando raio? Se abaixou pondo a cabeça no chão, protegendo a cabeça envolvendo as mãos na nuca, encolheu o corpo, apertava os olhos fechados. O vento parou. Josué se levantou, olhou e não havia mais ninguém. Nem homem, nem moça, nem velho. Olhou para trás. Mas que diabos aconteceu aqui? Pensou. Quando foi levantar reparou que a sua frente, no chão, tinha uma pedra circular, com uns 2 cm de raio, era marrom, mas, quando a luz batia, era rajada com amarelo. Entendeu. Era um presente para o menino.
- Agora quem é que é que deu esse presente? 
Olhou novamente, não havia ninguém. Pegou a pedra do chão e, antes de sair, gritou sozinho:
- Muito obrigado, viu? Vai andar sempre com ele. 
Virou as costas e caçou o rumo de casa ainda meio confuso com toda aquela gente da cachoeira.

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Bela ou artista?



Era uma dessas noites em que nos encontrávamos para discutir arte e cair na bebedeira. Mais pela bebedeira do que pela arte, creio eu. Estávamos em uma mesa grande, hoje muitos compareceram ao bar do Friedrich. Ele era um homem bastante sisudo com um bigode que lhe escondia o lábio superior, mas, no fundo, tinha um coração imenso [e sempre perdoava nosso fiado]. Por vezes sentava a mesa conosco, mas nunca sabíamos se ele era a favor ou contra um argumento, sempre mantinha a mesma cara séria. 
Cheguei e já era um tanto tarde, a mesa já estava com muita gente acompanhada de copos, cigarros e charutos. Ao me aproximar todos me saudaram com um brinde barulhento. Já estão bêbados, pensei e ri. Sentei-me ao lado dos companheiros e começamos a discutir. Foram quadros políticos, economia, o que é a arte, novos artistas, bundas alheias, assuntos que os bêbados adoram curtir no álcool.  
Lá pela tantas me perguntaram:
- Se puderes tu escolher entre ser só bela e ser artista, com qual ficarias?
Não foi uma decisão difícil, logo já havia uma resposta. 
- Bela, sem dúvida!
As sobrancelhas se arqueavam e as bocas, nas quais os copos cheios de bebida pousavam, esboçavam um sorriso sarcástico. Eu mesma ria.
- Oras, mas por quê? Frida me perguntou, enquanto cruzava as pernas e trazia o cigarro a boca.
- Muito simples. Ser bela não dói, não te afunda. Não te obriga a sucumbir todo santo dia nas mazelas suas e do mundo. Ser somente bela, não te traz a consciência da imensidão e pequenez do homem. Ser somente bela não te aprisiona a caneta e ao papel, ou ao pincel e o cavalete, ou ao palco, ou ao corpo. Não te exige inspiração e não te desespera quando a maldita some. Não te faz exigente ao escrever três páginas inteiras e arremessá-las ao vento por não serem boas o suficiente. Ser bela agrada a todos, ser bela não precisa de posição política. Ser bela não te oprime o peito. Ao ser bela não há preocupação de conteúdo [a beleza se basta]. As belas recebem visitas, tem tempo, se olham no espelho, não frequentam bares, não se embriagam, não desanimam, não se queixa, não tem medo de morrer sozinhas. 
A mesa me olha com olhos de concordância muda.
- Acho até que no mundo deveriam haver mais beldades e menos artistas. Os artistas tocam, fazem os outros pensarem, mostram as dores, as lágrimas, as entranhas, trazem realidades tapadas, fazem as lágrimas rolarem. 
Silêncio a mesa. Ergui o copo e prossegui:
- Somos imundos, sujos, inquietos. Somos agonias a amostra, banquete de desejos não cumpridos, saudades martirizantes, sexos intermináveis, vontades incompletas. Somos o melhor e o pior do mundo.
Todos erguiam também seus copos e brindavam o nada e o tudo de ser artista. E por fim disse:
- Quer dizer, somos não! Vocês é quem são! - todos pararam me olhando. Ergui a perna desnudada pelo vestido e coloquei-a na mesa - Porque eu sempre fui só bela! Riram todos pedindo ao Senhor Friedrich mais uma rodada de tequila.

terça-feira, 17 de junho de 2014

Ouve a voz [porque a vida chama]



Acorda moça, acorda! Abre a janela e vem ver o sol que se mostra com todos com seus raios vibrantes, quentes e luminosos te ofertando mais um dia de lutas e vitórias.

Acorda moça, acorda! Vem ver a passarada feliz pelo novo dia, vem ouvir o canto que sai. Vem moça, vem. Eles cantam pra você também, perguntando cadê a moça que nunca mais apareceu? Ela nos dava migalhas no ar e ficávamos de pança cheia no café da manhã.

Acorda moça, acorda! Assim você perde o começo da festa, o sol já se apresentou, a natureza de arrumou, daqui a pouco a criançada começa, o parque na sua frente fica cheio de alegria e você nem vê.

Acorda moça, acorda! Você nunca mais comprou pão quente a balconista te procura quer saber cadê a moça que desapareceu da gente?

Acorda moça, acorda! O vento bate na janela, força a dobradiça, se atreve a entrar sussurrando só pra ver se te encontra no quarto se arrumando.

Acorda moça, acorda! Abre logo essa cortina, escancara essa vidraça, dê o sorriso para a gente que fica na expectativa de te ver aparecer linda na janela.

Acorda moça, acorda! Cadê sua forma exuberante que desfilava estonteante pelo caminho do parque para os olhares da gente?

Acorda moça, acorda! Moça, por que você não nos responde? Cadê seu bom-dia doce? Cadê o cabelo solto? Cadê a moça?

Acorda moça, acorda! Moça você está aí dentro? Nunca vi tanto sumiço é mesmo um desperdício não poder te encontrar.

Acorda moça, acorda! O que será que te aconteceu? A sacada está deserta, parece até que se mudou, a janela sempre aberta faz tempo que se fechou e se mantem coberta pela cortina enegrecia que nunca mais desatou.

Acorda moça, acorda! Desculpa a insistência, não faço por maldade, mas queria mesmo saber por onde a beldade que enchia o peito velho de pura mocidade e balançava os meninos por toda essa cidade.

Acorda moça, acorda! Assim já não dá mais, vai beirando o fim da tarde, com o silêncio trazendo paz, o sol cansado da espera vai deixando a moça para trás.

Moça, você ainda não acordou? Em sua casa nem um movimento, nem um ruído, nem a respiração, só dá para ouvir um lamento bem lá do fundo da casa, no quarto, no canto da parede. Será que a moça sofre descontente?

Moça? Moça? Você está nos ouvindo? Queria te ver sorrindo antes de ir embora.


Mas a moça não ouvia a voz da vida chamando, estava enterrada no travesseiro coberta de lembranças e tristezas. Não pôde ver, as lágrimas lhe embaçavam os olhos. Não podia sentir nada mais além de dor. Estava encarcerada em sua própria agonia, em sua própria solidão. E, por enquanto, era assim que se aprisionará desde que ele arrumou as malas e partiu seu coração.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Amor[es]



Hoje acordei lembrando que dia é hoje. O belo e feliz dia dos namorados! O dia em que estão liberadas as flores, champanhe, chocolates e o sexo! Para o dia de hoje todos podem também ser românticos, aliás isso está no protocolo do dia. Não importa o quanto ogro ou ogra você é a vida toda, hoje, exatamente hoje, essencialmente hoje, deve-se fazer biquinho e dizer o quanto se ama, deve-se estrear as fantasias que sempre quis, deve-se desnudar das besteiras do dia a dia e se jogar na verdade do coração. Dia bonito esse, todos felizes [espera-se]. Acordei pensando nesse dia e, ao ver o meu amor ao meu lado dormindo um sono bom, fiquei refletindo no assunto. Afinal de contas o que é ou o que deve ser namorar? Qual seria o ideal daqueles que namoram? O que deteriora, verdadeiramente, os relacionamentos? O despertador tocou, a casa acordou, o dia surgiu, mas o pensamento ficou perdurando na cabeça e durante todo dia estive a pensar nele. Ainda penso na verdade, mesmo agora. Acho [na real] que não existe ideal de nada, mas consigo encontrar o desastre das relações. Ele fica encrostado em uma coisa de cada um, um troço maligno chamado expectativa. Ahh! Tenho até medo disso. Essa menina danada faz com que pensemos de forma cega. Geramos tanta expectativa pelo outro que nos decepcionamos facilmente. Pense bem. Você se entristece pelo o que ele não falou, por ele não ter respondido como esperava. Você se entristece pelo presente que, poxa, pensei que ele ia comprar outra coisa. Convenhamos, é surreal nos colocarmos para baixo [digo nós, seres humanos, homens e mulheres] porque o outro está sendo verdadeiro simplesmente, por ser ele mesmo, por pensar do próprio jeito. Ao que parece não queremos exatamente a pessoa ao nosso lado, queremos o nosso sonho ideal maluco. Não queremos a benfeitoria do outro, nem a vemos ao acontecer, queremos ter o que contar para os amigos, queremos os príncipes e princesas da Disney. Nossa geração de expectativa é criada em uma ilusão de perfeição que simplesmente, definitivamente, indiscutivelmente não existe. Acabamos por perder, em discussões insensatas, o essencial da vida a dois. Nos obrigamos a vida em um labirinto infinito no qual só se chega ao final se, e somente se, os passos dados estiverem na ordem ordenada milimetricamente simétrica da lei clássica. Exigimos préstimos capazes de deixar Hércules e seus 12 trabalhos no chinelo. E, claro, o mais importante, somos ditadores do outro sem querer que ele seja.  Reclamamos das ações externas e quando somos cobrados pensamos: nossa, nem reconheceu o que fiz. Será que não viu que estou fazendo o máximo de mim? E não digo isso somente para os relacionamentos enamorados, encaixo também nesse patamar todas as formas de amor humano. Somos bons, experts em exigência e péssimos em ações. Pensar em minha teoria também faz com que eu reflita lá para dentro de mim o que eu tenho feito aos meus amores. No final de tudo, não se chega a uma conclusão clara. Só percebo que ninguém tem a obrigação de fazer nada por ninguém. Não ache que é cruel, pois realmente não é. Temos oportunidades de fazer, mas nunca teremos obrigação. Engraçado, acho que tudo se resume à como o coração se abre a experiência do outro. E na leve embriaguez que o uísque lhe dava teceu uma manta filosófica a respeito das relações e corações, das almas gêmeas separadas pelo Olimpo, dos apocalipses no Éden, das tormentas ditatoriais, da liberação do sexo, da perda do amor, do encontro entre ela e ele. No dia seguinte, não se recordaria de todo o projeto filosófico descrito, mas a nuança do pensamento a alertaria: lembre-se de seus amores. 

terça-feira, 3 de junho de 2014

Como era?



Hoje li seu nome. Demorei a lembrar quem você foi...quem você era? Lembro me pouco agora, foram alguns anos de mãos atadas juntas. Foi uma estadia triste, involuntariamente triste. Era o nosso destino juntos, sempre fora, tristeza mútua e dividida. No fundo era o que gostávamos [mesmo] de compartilhar. A alegria nunca foi nosso forte, pequenos momentos, instantes...Talvez não fosse nada disso, mas a certa idade a memória vem fraca no oceano dos tempos. Só me recordo das lágrimas que as tuas duras palavras e ações me fizeram sentir cair do rosto e tocar a blusa atada ou o peito nu. Não por maldade, você só queria afogar seu ser no meu, suprimir toda a possibilidade de levante que o meu coração pudesse ter, não por maldade, mas por ódio a anarquia que a paixão me impulsiona[va]. Sabias como eu era, impulso e sentimento [será que ainda sou?]. Nunca conseguiríamos nos manter juntos até porque o seu cárcere nunca foi o meu, nunca conseguiu restringir o meu eu. Ainda não entendo bem o que foi estar junto de você, me parece uma névoa, uma neblina, um lampejo opaco do que talvez vivi. Será que vivi? É que a essa altura do tempo já me falta a memória, da única coisa que ainda tenho certeza é a breve possibilidade da morte. Tento recordar, mas não me vem nada. Como era o riso? O toque? O cheiro? Não...nada. Somente os traços sisudos de quem não gostava muito de viver. Vislumbrando as condições de tempo e espaço de minha [breve] vida penso se você...se você mudou. Será que agora entende a importância de estar do lado? Será que sabe fazer o outro feliz? Será que sabe se fazer feliz? Esperando meu café, com bordas de doce de leite, especialidade do Fran's, conjecturo a respeito da sua vida. Te imagino rei, te imagino rico, te vejo feliz com seu orgulho e soberba. Rindo aos quatro ventos contos ilusórios de como eu era um fardo, um câncer a ser extirpado. Não me dói, sinceramente. Me divirto com as cenas mentirosas do que nunca fomos, nem poderíamos ter sido. Por que entrei na sua vida? Sabes como eu era [ou será que sou?] sempre procurando o mítico no real, o ideal no concreto. Por que se há de demorar assim em um pensamento sem fundamento? Oras, porque é o que me resta a essa idade. Deixe ao menos o velho imaginar a vida alheia, há algum divertimento nisso. Te vejo sem medida, bêbado por um bar, a contar os louros das derrotas de toda uma vida. Maltrapilho, vagando cambaleante, pois o bar já fechou. Usufruindo da deliciosa miséria de sentir as culpas suas: por que? por que? por que? Ecoando sem fim em sua mente. Quem sabe talvez sejas um bêbado rico, por sorte do destino. Riu solitariamente na mesa com o pensamento sem sentido daquele segundo, e é o tempo da bela garçonete trazer o café. Quem sabe virou artista em outro país e tem o nome estampado nas capas dos cartazes da rua. Pode ser que tenha se deixado levar pelos "amigos" comuns e se tornado só mais um no acaso do mundo. Mais um funcionário normal, com um bom trabalho, salário mensal, com a carteira assinada e o happy hour garantido. Mais um de tantos que se enganam pela música ruim, pela cerveja, vodca, cachaça gelada. Mais um de tantos que tem a ânsia do mundo guardada no peito, mas que tem um medo ainda maior de não ser "normal". Mais um de tantos que levam uma vida assim: bem compromissado e empenhado em parecer igual e não se sobressair. Mais um de tantos que trabalham, comem, bebem, transam e gozam da aparência de normalidade ideal para o nosso mundo. Essa é a explicação mais provável. A mais chata certamente, mas a mais provável. E..e...e...E assim como veio, o pensamento se dissipou da mente. Provavelmente foi ingerido junto com a pequena dose de café e doce de leite. Parado, olhando a xícara vazia, o doce de leite raspado da borda, tentou ainda segurar aquele pensamento, mas já era tarde, já se foi a digestão. Oh, idadezinha sem vergonha, o que era mesmo que eu estava pensando?