segunda-feira, 11 de agosto de 2014

E o Rio?



Esse foi um final de semana diferente e, por isso mesmo, venho diferente, falando assim eu mesma, em 1ª pessoa. Tive a oportunidade de acompanhar uma viagem ao tão iluminado Rio de Janeiro, espaço geográfico quase mítico, quase como o misterioso Triângulo das Bermudas. Quem vive lá não larga, quem visita quer ficar. Essa movimentação interior, que move os corações daqueles que estiveram ou estão no Rio de Janeiro, me inquietou. Afinal de contas o que há de tão esplendoroso nesse lugar? Confesso que viajei com ares de Sherlock Homes para desbravar as pistas do movimento universal de amor àquela cidade. Na mala levei minha lupa e meu cachimbo de soltar bolhas e, claro, um biquíni para as horas livres de detetive [todos somos filhos de Deus, não é?]. Todos sabem [e os que não sabem saberão] que o Rio de Janeiro é palco de formosura e por lá desfilam grandes belezas. Temos morros, pedras gigantescas, grandiosidade aterradora para qualquer ser humano mais sensível. Temos as belezas arquitetônicas colocadas ali, milimetricamente pensadas para que o encanto envolvesse toda a atmosfera do lugar. São verdadeiras esculturas ao ar livre. Temos a orla que não teria como não ser divina envolta de tanto mar. Temos os sorrisos bronzeados dos que passeiam pelos calçadões e parecem ter se perdido do mundo real por esbanjar tanta alegria. Temos muitos e muitas com poucas roupas, por causa do calor claro, desfilando corpos normais, vivos, belos, ostentando sensualidade e calor [mesmo que sem querer] por poros abertos pela maresia. Ah, uma paixão mais que especial, e bastante íntima, temos o sotaque carioca. Ai, o sotaque! Não sei o que há naquele jeito mole de falar que me envolve de ternura e graça e sinto vontade de ir para praça escutar o povo a falar. A falar qualquer coisa, até um xingamentozinho, uma briguinha na rua, um “vai tomar no cu” do motorista de coração e carro fechado, dito sem medida. Coisas de quem se formou em letras e se apaixona sem medida pelas peripécias da língua. Em contraponto, como toda cidade real, temos problemas também. Vi assalto, tive desconfianças dos outros, tive medo, andei com poucas coisas, não chamei a atenção, fechei a cara [como se isso me assegurasse de alguma forma], olhava para todos os lados, tive atenção redobrada. Mesmo com a lupa sempre a postos e o olho aberto, arregalado, não conseguia entender o porquê daquele cenário ter sido cantado por tantos grandes nomes. Não conseguia entender o porquê de terem tantos textos belíssimos, de fazer qualquer um suspirar, escritos para aquele lugar, por aquele lugar. Não conseguia entender o porquê de tantos defensores fanáticos da cidade. Qual é o mistério mítico do Triângulo do Rio de Janeiro? Repare que eu disse: não conseguia. Hoje eu consigo. Fui convidada para um jantar no clube Caiçaras, que fica em uma ilha [um pedacinho de terra] no lago Rodrigo de Freitas. Ao andar pelo clube conhecendo suas instalações, passeando por detrás das quadras, um estrondo de luminosidade guiou meus olhos, minha lupa e meu cachimbo para a compreensão de tudo. Então era por isso! Lá atrás das quadras, longe dos meninos gritando, longe das bolas chutadas, havia uma fenda para um universo silencioso e convidativo. Ao atravessar para este lugar pude ver o que outros tantos antes de mim viram e entendi os versos, as odes para aquela cidade chamada de maravilhosa. Do lado de lá do portal as lâmpadas dos postes estavam apagadas possibilitando que minha visão se expandisse para o que estava ao meu redor. Vi um céu enegrecido, distante, com uma lua [quase] cheia e estrelas. Vi no chão uma cidade iluminada com toda sua pulsação, quase caótica, mas silenciosa como se todos se movessem ensaiados em uma mímica ritmada. Vi bem lá no alto o Cristo Redentor com seus braços abertos para uma luz levemente arroxeada. E, por fim, vi que entre o chão e o céu estava o contorno daquelas pedras, montanhas de sublime beleza que se destacavam do céu negro, contorno cinza enevoada que trazia uma sensação de divinizena. Era a substância de Deus na montanha, era a substância da montanha em Deus. Sabe aquela coisa? Eu estou aqui, você sabe que estou, mas só posso te mostrar minha sensação, minha borda, minha essência. E, naquele momento, simplesmente não importava que a ilha ficasse em águas tão poluídas que não se podia nadar, não importavam os crimes, não importavam as desconfianças, porque, naquele exato momento, eu pude ver a criação do mundo, da natureza e do homem em um breve lampejar de clareza. Não importava nada, a não ser parar e contemplar aquela grandeza [in]finita. Hoje consigo entender os versos de amor dos meus cantores prediletos e, por já ter descoberto o mistério, deixei minha lupa por lá mesmo pelas bandas de Copacabana, talvez a tenha esquecido em Ipanema, Botafogo, quem sabe na Lapa, no Arpoador ou no Catagalo, fixada em algum castelo de areia, em algum baile funk, em alguma mesa de botequim, para que quem sabe, quando volte, possa conhecer outros tantos mistérios da cidade que é também para mim maravilhosa.

"Vai, meu irmão
Pega esse avião
Você tem razão de correr assim
Desse frio, mas beija
O meu Rio de Janeiro
Antes que um aventureiro
Lance mão"

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Ana e Frida


Ela se preocupava um pouco Ana geralmente não demorava a voltar para casa e já passava das nove. Não quis pensar em nenhuma tragédia, mas o coração que ama só enxerga besteira. Tentou não pensar naquilo, logo, logo Ana estaria em casa. Realmente não tardou muito e ouviu a chave na fechadura, mexendo rigidamente para o lado direito, vencendo o segredo e abrindo a porta. Frida se ajeitou e virou os olhos para porta:
– Até que enfim!
Enquanto Ana entrava dizia:
–  Eu sei, eu sei, eu sei, estou atrasada. – Fechou a porta e a trancou, entrou pela sala e olhou para Frida – Desculpa o atraso e para de me olhar assim! Já estou aqui!
–  Fiquei preocupada, o que aconteceu?
–  Desculpa, é que encontrei uma amiga, a Helena, lembra-se? Ela já veio aqui. Encontrei com ela e ficamos batendo papo ali no shopping e quando vi já eram essas horas.
Ana se aproximou de Frida e a beijou. Foi entrando no quarto, guardou a bolsa, sentou-se na cama, tirou o sapato que estava apertando o mindinho.
– Meu Deus, eu ainda fico sem esse dedo! E aqui, aconteceu alguma coisa? Como foi seu dia?
– Você sabe como é, né? Minha vida é um tanto monótona. Dormi um pouco, pensei um pouco, nada fora do comum.
–  Hum, é mesmo?
– É sim.
–  Nossa, eu estou morta de fome. Vou fazer um rango, está a fim?
– Sempre!
Caminharam para a cozinha, Ana pegou as panelas e o macarrão. Frida ficou junto dela, escorada na bancada americana que dava para a sala.
- Sabe Frida, até que foi bom encontrar Helena assim de surpresa.
- Por que?
- Meu dia estava tão triste, tão sem graça. Tive que ouvir cada asneira, cada idiotice, cada bocozisse.
- Por que?
Ana olhou para a companheira a expressão de dúvida que Frida fazia estava tão bem desenhada que fez com que Ana risse.
- Para de rir de mim!
- Sua cara de dúvida está tão marcada que se eu fosse você virava atriz e ficava rica. – Ana riu novamente –Continuando, hoje foi um daqueles dias de cão.
- Sei, aqueles bichos feios!
- Fiz um cronograma de tarefas que deveria cumprir durante o dia, mas não consegui finalizar graças aquele B-O-C-Ó do meu chefe que não para de fazer reunião para nada. Sabe nada? Então, nada. Minha mesa entulhando de tanto papel, relatório, avaliação, requerimento, processo, atualização, decisão e não consigo ficar sentada 5 minutos em paz. Arh!!!
Enquanto falava sobre seu dia Ana aumentava a voz, virava as mãos como se arrancasse alguma coisa do vento, sacudia a cabeça, fazia bico, mudava de voz. Frida, que já conheci Ana fazia tempo, preferiu não expressar opinião. Sabia que ela estava irritada, sabia que não era hora de falar só ouvir, sabia que em breve isso passava e sabia que, por mais brava que estivesse, não conseguia ser uma pessoa dura. Ana nascera para ser doce e Frida sabia disso. Depois do jantar reclamão e do carinho dato pelos olhos atentos Ana abaixou a guarda e decidiu que não pensaria mais nisso.
- Deixa para lá, não é? Só porque meu dia não começou bem, não quer dizer que não vai terminar bem. Que tal filme largada no sofá?
- Claro!
Assim decidiram, assim fizeram. Ana sentou-se meio deitada no sofá, Frida deitou em seu colo e sentiu o calor da mão que lhe acariciava com cuidado e amor. Frida sabia que era amada e que Ana nunca a machucaria e que, por mais difícil que fossem os dias, tudo passava. Amor, amor era assim mesmo e o delas era puro e verdadeiro. Não importava o que dissessem sobre o assunto, não importa o que os outros achavam – “Eu hein, que coisa estranha” –, as duas sabiam que eram uma da outra como predestinação. Carinho se cria, amor tem-se ou não. Ana havia a acolhido em um momento muito difícil, estava sozinha, triste, desiludida, largada no mundo, mas a partir do momento que seus olhos se cruzaram sorrisos nasceram em seus corações. Era mais do que gratidão, era mais do que carinho, era um amor sem medida, um amor que cuida. Pensando nessas coisas, de olhos fechados, ao receber as carícias esperadas por todo o dia, Frida adormeceu. Quando abriu os olhos novamente já devia ser umas 2h da manhã. Espreguiçou-se, levantou, acordou Ana:
-Vamos para cama?
- Hum, já vou. Deixa eu me colocar no lugar. Ai meu pescoço, fiquei toda torta.
Ana caminhou meio cambaleando para cama, colocou um pijama, ajeitou as cobertas, apagou a luz.
- Você vem?
Disse Ana.
- Só até você dormir, sabe que a noite eu não tenho sono.
Ana adormeceu sem saber o que Frida dizia. Ana nunca saberia o que ela dizia e Frida nunca saberia que não era entendida. Frida, a gata vira-lata adotada a pelo menos 3 anos, não sabia que a dona não a entendia, imaginava que suas conversas eram feitas com completude. Ana, que sempre conversava com a companheira felina, imaginava o dia em que seria respondida pela mais compreensiva amiga que já teve. Elas não se comunicavam verbalmente, mas seus corações eram próximos, unidos, se correspondiam. Carinho se cria, amor tem-se ou não e elas tinham.



*Em homenagem a minha querida companheira, aquela que não sabe ler palavras, mas que decifra meu humor como ninguém.* 

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

B-day


Se você veio aqui atrás de uma história talvez se decepcione um pouco. No dia de hoje a criatividade me faltou e eu me lembrei de uma história que não conheço o fim e que, na verdade, me lembro pouco. Nesse mesmo dia 1º de agosto nos anos 90 uma mãe, entre várias na Terra, sentia as dores de colocar no mundo vida nova e, lá pelas 11h e pouco, nasceria mais uma alma para compor esse mundo. Era uma vez eu, menina de olhos fechados, bochechas grandes e cabelo liso. Cheguei no mundo cheia de amor ao redor, primeira filha, primeira neta, primeira pequena a povoar os braços da família. Nome escolhido pela mãe: Mayara. Foi dado o start da vida. De lá pra cá muito e pouco aconteceu, afinal de contas não sou assim tão velha. Brinquei, chorei, vi meus pais se separarem, senti frio, tive irmãos, viajei, sonhei com ares de artista, imaginei o mundo de Jonh Lennon, me apaixonei por poesia, por música, por arte, sofri amores, senti todas as dores do mundos, fui feliz, fiquei rebelde, quis e não consegui, tentei e deu certo, rezei, pedi, me esforcei, acreditei, corri, rolei na grama, ganhei presentes, dei presentes, filosofei, calculei, escrevi, cresci. Tenho deixado a vida me viver, me experimentar, me permitir, me mostrar. Provavelmente você não me conheça, ou conheça pouco. Mas não se incomode com isso, eu também sei pouco sobre mim, até porque sou muito nova para ter consciência. Só tenho pensando na minha real essência a pouco tempo, só tenho me descoberto como ser pulsante em poucos anos. Não deu tempo ainda para vasculhar tudo de mim, mas vou seguindo a busca amiúde, sem pressa, conhecendo cada ponto fundo a fundo. Sei mais de mim hoje, saberei mais ainda amanhã. Acordo no dia do meu aniversário com reflexões profundas do ser, do mundo, da vida e me vem uma vontadinha de chorar de tudo e nada ao mesmo tempo, felicitações me apitam no celular, ligações intermináveis e maravilhosas, um sorriso :) As reflexões se dissipam, hoje não é dia de chegar ao fundo do mundo [de mim?]. Penso que tenho muita propriedade para dizer que sou feliz, que minha vida é boa e que tenho todos os maiores tesouros do mundo. Me animo, me crio, me governo, me deixo ser levada. Essa sou eu: menina pequena de sonhos grandes, coração perdido, mas sempre a postos para ajudar. Essa sou eu: mulher, gente grande, forte, intensa, impaciente. Essa sou eu: tipo escritora, que gosta de mostrar um punhado de sonho em letras. Essa sou eu: alma velha, com a profundidade de tudo em si, com a vontade de acreditar nas mudanças, com a certeza de que lá vem novidade. Essa sou, bom, pelo menos, por enquanto.